quinta-feira, 16 de outubro de 2008

< ENTREVISTA COM JUNIOR ANIMAL >


Figura certa do set list da alternatividade Fortalezense, Moacir Junior, Animal ou Dj Mechanimal, é um indivíduo no mínimo curioso. Acredita na revolução interna da humanidade, estuda filosofia, cursou enfermagem até o sétimo semestre e largou para se tornar tattoador, é pensador e fomentador da cena eletrônica local, já teve uma banda anarcopunk ,... Enfim, não vou falar mais nada, a entrevista por sí só fala tudo...Espero que curtam...


P > Você é tatooador, Dj de trance, produtor cultural, produtor de eventos, produtor musical, empresário... Como tu consegue cara?

Junior Animal > Pois é, realmente é muita coisa ao mesmo tempo. Eu tava até comentando com um cliente, que muitas vezes me passa pela cabeça a idéia de fechar a loja (Kalendoscopio estúdio), porque assim, a administração dessa loja aqui não tem nada haver com arte, é uma coisa que é empresarial mesmo e eu já venho me desvencilhando de um monte de coisa empresarial. Por exemplo, loja eu tinha duas, ai peguei e fechei uma, tinha um negócio de revenda de material pra tatooadores onde revendia tintas, maquinas, agulhas, não só aqui, mas pra todo o norte/nordeste, ai eu também fechei. Porque esse trabalho vai afastando a gente da arte, eu quero ter mais tempo pra trabalhar com outros tipos de arte e acabo não tendo.

Agora eu estou com a historia de não só de tocar música eletrônica, mas sentar na frente de um computador com uma placa de áudio fudida e criar a própria música, isso exige um tempo muito grande. Então isso me faz pensar – Pô, porque eu não fecho essa loja e fico atendendo meus clientes no Dereka e tal?...Pensando bem, essa sua pergunta é uma pergunta que eu não sei responder.

P > Hoje você é mais tatooador ou mais dj?

Junior Animal > Sou mais tatooador, faço isso há 12 anos, é a tatooagem que sustenta minha vida. Como tatooador sou reconhecido no exterior , como dj não, é uma coisa que mesmo se daqui a cinco anos eu estiver vivendo só do trabalho como dj ou produtor musical, eu não vou deixar de fazer, não tem condições, é uma coisa que eu amo, ta no meu sangue. Eu me formei numa faculdade (enfermagem) e mesmo assim abandonei tudo pra tatooar.

Quando eu me apaixono por uma coisa, eu acabo me entregando, foi assim com a tatooagem, está sendo assim com a música eletrônica. Conheci esse nicho, me enquadrei no psytrance, uma coisa que tem tudo haver com o lance anárquico da banda punk da qual tocava (anos 90 – benihana- “ a sociedade me olha torto...”), de romper com os padrões, atacar o capital, da questão de se envolver com a ecologia, de procurar a transcendência mental através da dança hipnótica, através do uso de enteóginos e por ai vai.

P > Aqui no Ceará observa-se que existe uma cena eletrônica, as festas acontecem, o público marca presença, atrações internacionais tocam, mas ainda não se tem muito trabalho autoral por parte dos Dj’s, o que ta faltando pra isso acontecer?

Junior Animal > È uma coisa que ta faltando e certamente vai ajudar a fomentar a cena, mas que também é natural que ela esteja só acontecendo agora. Como o umbigo da coisa cultural é o eixo RJ-SP, as coisas vão acontecer primeiro lá pra depois...por exemplo; as grandes festas de música eletrônica primeiro foram lá, pra depois rolar em Brasília, depois ir pro sul e somente depois disso chegar por aqui no norte/nordeste. A questão de produção autoral é a mesma coisa, você vê que surgiu um live aqui, em João Pessoa, Natal, em Belém já tinha até a mais tempo que aqui, é como se fosse uma cadeia alimentar, acontece na Europa, depois RJ-SP e depois se espalha pelo Brasil.

P > Como Dj e produtor qual sua percepção da cena eletrônica daqui? Quem é ela?

Junior Animal > Na verdade essa história de cena existe uma discussão se realmente a gente tem uma cena em Fortaleza, ou não. Porque a palavra cena é utilizada em qualquer tipo de área pra quando existem pontes entre os determinados pilares de tal cena, essas pontes se comunicam, trocam idéias, informações, trocam ajuda uma com a outra. Então se essa cena aqui de Fortaleza fosse uma pessoa, eu acho que era seria bi-polar, a personalidade dela seria um distúrbio bi-polar, pois ora ela é uma coisa e ora ela é outra.

P> Bi- polar é a oscilação entre euforia e depressão...

Junior Animal > Exatamente, não só depressão e euforia no caso da pessoa em si, mas um dia ela ta com raiva de ti, no outro ela te ama, um dia ela é inimiga da pessoa no outro ela se une.

P > Eu li um artigo seu no sitie da nu-act que fala sobre isso, a idéia que eu senti no que diz respeito as produtoras foi que é “ cada um por si e derrepente, até um contra o outro”. È isso mesmo? A desunião é o que reina...

Junior Animal > É, isso é verdade, isso é a pura verdade. Porque é o seguinte, isso é um negócio, envolve dinheiro. Muita gente que está agora na cena produzindo as festas de trance, antigamente produzia as festas de tecno. Quando o tecno bombava, essas mesmas pessoas falavam mal do trance e diziam que o tecno era melhor e que o trance era isso, era aquilo... Quando o trance começou a ganhar público e ter o boom que ele teve, esse pessoal todinho que fazia as festas de tecno começou a fazer as festas de trance. Como eles não entendiam de trance, digo não entendiam, não porque o movimento caiu de para-quedas no quintal de uma pessoa e aquela pessoa é a dona do movimento, longe disso, mas porque essas pessoas realmente não possuem experiência dentro do movimento.

Nenhum dos produtores daqui foi pra um festival de trance, eles não tem a menor idéia de como o movimento trance nasceu, o que ele prega, qual a sua tendência de futuro, eles não tem a menor noção disso. Pra eles é um negócio... Como eu posso fazer? Que Dj vou trazer ? Como posso fazer a festa mais barata pra obter mais lucro?... Claro que ninguém vai fazer uma festa pra se ter prejuízo, mas aqui existem pessoas colocando a festa dentro de um conceito que o movimento pede, pra espelhar um movimento que existe no mundo todinho e existem outras pessoas que não se preocupam com isso. O mais impressionante é que quem mais briga é justamente o pessoal que estão fora deste conceito, as pessoas que querem somente o dinheiro.

P > Você faz parte das pessoas que buscam esse conceito, está sempre indo para os festivais, pesquisa a cultura, agora está buscando produzir seu som autoral. Dentro desse contexto negativo exposto, o que você espera do futuro da cena de Fortaleza?

Junior Animal > Quando eu falei que às vezes o pessoal levanta a questão se existe ou não a cena, os grandes pensadores que temos, Rodrigo Lobão, Fill, Tony Mazzoti, quando essa galera questiona se tem realmente ou não, é porque a galera pensa que cena é aquilo que eu falei anteriormente, todo mundo se ajudando, a coisa fomentando e as pessoas caminhando junto.

Pra mim, a gente tem uma cena, a coisa ta evoluindo, a quantidade de festa está crescendo, o próprio público crescendo e ficando mais consciente do que é o conceito da coisa, a cada dia mais dizendo assim – Esse produtor não é legal, não é legal o que ele fez com o público.... Sobre o futuro, acredito que tudo no mundo está em transformação, cada vez mais essa transformação é mais rápida, a tecnologia faz com que aconteçam transformações gigantescas. Veja bem, em cinco anos o google transformou o mundo, orkut em dois anos mudou tudo, então a evolução da coisa tá a cada dia mais rápida, não se sabe o que vai acontecer daqui a um ano.

Baseado nisso, eu acredito numa autoregulação da coisa, as mudanças vão estar cada dia mais rápidas e a própria cena vai se autoregularizar, assim como eu acredito que a própria natureza está se autoregularizando em relação o aquecimento global. Mais cedo ou mais tarde, sem precisar fazer nada, vai sair da cena gente que não presta, vai entrar gente que presta, naturalmente vai ter gente sendo expulsa da coisa, acredito num futuro promissor, acredito também que todos os estilos vão se transformar, se misturar juntamente com as pessoas.


P > Qual é o papel do público na evolução da cena local?

Junior Animal > O público tem a faca e o queijo na mão, é o publico que escolhe em qual tipo de entretenimento ele quer ir, ele que escolhe onde colocar o dinheiro dele, é o público que escolhe se prefere o teatro ou a música. É um fator crucial, é ele que decide se vai comprar uma passagem pra Europa e fazer turismo por lá, ao invés de fazer por aqui. Na verdade, é ele quem manda, na hora que o público disser que não vai mais pra evento de fulano, ele não vai mais e pronto. Na hora que o público acordar e perceber que o poder na hora do voto está na mão dele. Na hora que cada nicho acordar, ele vai ter condição de tomar consciência e fazer uma verdadeira revolução da forma que ele quiser.

Veja bem, essa revolução que estou falando é uma revolução interna, psicológica, não é armada. Quando uma quantidade suficiente de pessoas despertarem, o resto desperta. Na ciência isso se chama ressonância morfogenética, quando determinada parcela da humanidade despertar pra nova era, pra como a gente tem que consumir, o que tem que consumir de bom, como a gente tem que absorver energia, pois a forma atual está ultrapassada. A combustão da água já foi inventada, o carro elétrico já tem, porque temos que queimar tanto óleo? Submetidos a um sistema financeiro que se mostra quebrado? Porque cara? Cada dia mais as pessoas estão despertando e vendo que estamos vivendo de forma desarmônica com a natureza, com a energia, a gente ta completamente mecanizado e isso ai ta selando nosso fim.

P > Pra finalizar, eu lembrei de um lance que tu me falou faz um tempo. Perto dos 20 anos você teve um acidente que acabou resultando na amputação de uma das suas pernas, ao contrário do que se espera, um dia você me falou que isso foi uma das melhores coisas que aconteceram na sua vida. Explica melhor essa história...


Junior Animal > Parece loucura escutar isso, mas é assim cara. Como um analisador do rumo que a raça humana toma, eu acredito que a principal coisa que lutamos é contra o ego, o lado direito de nossa mente, do cérebro, o lado físico, o lado que se preocupa com o espaço, com o tempo, com a profissão. Então, a principal luta do ser-humano hoje em dia é tentar se desvencilhar do ego, pra fazer com que o outro lado do cérebro comece a trabalhar, que é o lado emocional, o lado que trabalha com a questão de absorção de energia, de entender coisas que não estão nesse plano físico. Acredito que vivemos numa constante batalha entre esses dois “eus”. Quando você consegue vencer um pouco o ego, a gente abre a cabeça pra um monte de coisas que a maioria não consegue enxergar.

Então, imagina uma pessoa no auge dos 20 anos, quando o ego é tudo, quando o que mais se quer é uma gatinha, cortar o cabelo pra ficar legal, a próxima roupa...quando você recebe um golpe no qual perde uma perna, nossa... você passa por uma pós-graduação rápida nessa história de vencer o ego. Então foi mais ou menos isso que aconteceu comigo velho, nesse choque gigantesco que aconteceu, eu consegui entrar um pouco na mente emocional. Essa ponte que consegui fazer é como se eu tivesse jogado um novelo, ido até o outro lado, jogado o novelo e conseguido voltar. Então quando eu quero ir pra o outro lado eu sei o caminho, porque na verdade, você não se desvencilha do ego. De vez enquando ele toma conta de ti de novo e quando tu se vê. – Caralho isso aqui é o ego todinho que ta tomando conta, vou parar ele aqui.

A grande benção pra mim foi que aprendi rapidamente o caminho parar frear o ego e funcionar com a outra mente. Nessa catástrofe imensa que fui pro fundo da lama, ao mesmo tempo olhei pra cima e acionei um foguete que fez puuuufffffff (gesticula com a mão virada pro alto). Niech dizia que o ser-humano evolui todo dia... Agora, grandes evoluções são sempre concebidas a partir de idas ao fundo do poço. Pode prestar atenção que na verdade tudo de ruim que acontece na nossa vida, se tu prestar atenção tem algo de bom no meio. Quando você se coloca como observador é mágico e impulsionador. Com minha catástrofe, eu consegui vetorizar essa historia de me tornar um observador da minha própria vida.

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Não vou falar nada....


Um comentário:

Paulo Ricardo disse...

Certamente o animal é um grande exemplo de vida, naum so de vida
mas sim de luta e conquista...
Estive o prazer de conhecer seu estudio e pra mim foi muito gostoso por ser um ambiente muito lindo e armoniozo.